PL propõe volta da censura às salas de aula
A deputada distrital Sandra Faraj (SD-Solidariedade) está propondo um projeto de lei na Câmara Legislativa com objetivo de implantar o “Programa Escola sem Partido” em todas as unidades de ensino no DF.
O PL é baseado no ideário de uma ONG de mesmo nome – Escola Sem Partido – que, segundo o próprio site da instituição, luta pela “descontaminação e desmonopolização política e ideológica das escolas”. O coordenador da tal ONG, Miguel Nagib, não mede palavras. Para ele, “a maioria [dos alunos], vítimas dos militantes disfarçados de professores, nem sequer tinha condições de reconhecer que parte do ensino era ideologicamente orientada pelo pensamento de esquerda”.
Voltando ao PL de Sandra Faraj, a justificativa é a de que “lamentavelmente, o Brasil assiste a um processo de doutrinação ideológica visando a destruir os fundamentos da democracia, com incentivo declarado do partido que está o governo há 12 anos, e deverá neste permanecer por mais quatro anos, no mínimo”.
Em outro ponto da justificação do PL, Sandra Faraj alega que “urge, portanto, informar aos estudantes do direito que eles têm de não ser doutrinados por seus professores, a fim de que eles mesmos possam exercer a defesa desse direito, já que, dentro das salas de aula, ninguém mais poderá fazer isso por eles”.
Cabem aqui algumas reflexões. Note-se que o PL de Sandra Faraj, ao contrário do que propõe – o pluralismo de ideias no ambiente acadêmico – visa a tão-somente atacar determinada corrente do pensamento, tornando tacanho o ato de pensar.
Os professores são, sim, militantes em sala de aula. Mas não de um partido político ou de determinado ideário. São militantes das vertentes democráticas de Paulo Freire. “Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão”, dizia ele. Ou seja, o ensino-aprendizagem acontece em “mão-dupla”, um ir e vir de conhecimentos através do diálogo aberto, identificando problemas, levantando hipóteses, analisando e sintetizando ideias, descobrindo e estabelecendo relações, transcendendo ao aqui e agora, vivenciando valores e crenças que promovem a vida.
A educação é, sobretudo, troca, debates, construção de ideias e formação de hábitos que precisam ter como ponto de partida a formação ética e a proposta de construção de novas visões de mundo e busca pela justiça social e na certeza de luta pela igualdade.
O papel desses profissionais é o de fazer com que o educando participe do seu grupo ativa e afetivamente, apropriando-se de valores, crenças, conhecimentos acadêmicos e referenciais sócio-históricos. Precisa criar as condições de conhecimento, consciência e capacidade de pensar que os coloquem frente aos desafios da vida, prontos para decidir de modo complexo, ou seja, pensando em seus interesses imediatos, futuros e também nos interesses coletivos e comunitários.
Mas a deputada Sandra Faraj pelo visto entende, por meio de seu projeto de lei de natureza disfuncional e ultrapassada, que visões antagônicas de organização da sociedade não podem conviver, mas competir pela “cabeça” dos alunos.
A solução do problema é simples, pelo menos para Sandra Faraj. Basta censurar os professores, proibi-los de pensar e de fazer com que os alunos também pensem, comparem ideias e reflitam sobre a nossa realidade.
O “Programa Escola sem Partido” pode ser muito bem chamado de censura ou patrulhamento. Ou de “Programa Escola sem Noção”.