Para professor, categoria deve abandonar “velha pedagogia tradicional”
A qualidade do ensino e as formas de financiamento foram um dos temas que mais marcaram, este ano, o debate sobre educação. Da discussão parlamentar para aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE) com destinação de 75% dos royalties do pré-sal e 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação, no início do ano, até a classificação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), neste segundo semestre, os temas pautaram a mídia e o discurso eleitoral.
Um estudo da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados indicou que a educação pública receberá R$ 364,5 bilhões do pré-sal em 17 anos, e que esse valor poderia ser muito maior, chegando ao triplo disso. Quanto ao financiamento, vários estudos demonstraram que sem os recursos do pré-sal e os 10% do PIB (fontes listadas como prioritárias no PNE), a educação pública não irá avançar no mesmo ritmo da demanda do povo.
“Espero que os recursos cheguem à educação. Mas o que temos visto é que mesmo com esses planos, alguns municípios e estados não conseguem realizar o que é previsto para eles, como é o caso do Piso Salarial, previsto no PNE. Só recurso não basta. É preciso comprometimento dos gestores públicos com as pautas da educação”, avalia Felipe Sinicio de Barros, professor de história do Centro Educacional São Bartolomeu, em São Sebastião.
Ele acredita que o pré-sal e os 10% do PIB podem fazer a diferença na educação, mas entende que o próprio sistema educacional e a mentalidade dos professores em relação à sua prática têm de modificar. “Não podemos ter um currículo que se baseie em concepções histórico-críticas enquanto professores praticam a velha pedagogia tradicional no cotidiano. É incoerente. Pré-sal e os 10% do PIB são um bom incentivo econômico, mas se não houver mudanças sistêmicas e, principalmente, mudanças na relação que nós professores estabelecemos com os estudantes, esse incentivo não bastará. Pode se tornar dinheiro desperdiçado”, afirma.
Aprovado no concurso de 2008 e récem-empossado, Felipe diz que ingressou no serviço público “por ideologia e por afinidade com os estudantes da rede pública”. Todavia, encontra dificuldades para falar de um modo geral sobre como o professor se vê na carreira. “É complicado estabelecer generalizações. Penso que o professor se vê como um lutador, um batalhador, sempre buscando garantir para si melhores condições de trabalho, valorização da profissão e para os estudantes uma educação de qualidade”, analisa.
Para Felipe, o plano de carreira dos docentes do DF é uma prova do avanço do setor. “Ele representa uma valorização profissional, porém, ainda há muito que fazer para que o professor se sinta plenamente valorizado”. Felipe atribui a conquista desse plano à greve longa e árdua, com muita negociação com o governo e muita pressão do mesmo para que os professores encerrassem a paralisação.
“Identifico-me com essa luta porque, além de contar com uma adesão considerável por parte dos professores, demonstrou a força dessa categoria para fazer valer seus direitos. Identifico-me, acima de tudo, com os colegas que fizeram parte desse movimento”, diz. Apesar do reconhecimento das melhorias, o professor do CED São Sebastião afirma que ainda há muitas mudanças a serem realizadas, como, por exemplo, a equiparação salarial com as outras carreiras de nível superior do GDF.
Ele lembra que, nessa luta por uma boa remuneração que proporcione tranquilidade, outro ponto importante a ser combatido é a progressiva tendência dos governos do DF de ampliar a contratação de professores temporários em vez da realização de concursos para a carreira. “A contratação temporária representa uma precarização do trabalho. É retirar direitos de professores que têm a mesma capacidade e qualidade dos professores efetivos. Há professores que atuam como temporários há 10 anos”.
Felipe considera possível à categoria conquistar a remuneração desejada, porém, só visualiza essa aquisição com luta e união, com engajamento e a busca dessa meta. “Quanto à contratação sistemática de professores temporários, só será possível frear essa tendência quando os professores efetivos, o sindicato e a categoria como um todo se sensibilizarem com a situação desses professores”, afirma.
Para ele, os(as) professores(as) só permanecerão na carreira se forem valorizados e, para isso, “falta maior acesso a cursos de capacitação, aprimoramento, pós-graduação para os profissionais da educação. A EAPE é um espaço importante, mas ainda não se faz presente em todas as regiões do DF, o que faz com que o deslocamento até ela desestimule o profissional a assistir os cursos. O acesso à esses cursos possibilitaria, ao professor, se manter atualizado em relação às novas demandas pedagógicas da sociedade, além de oferecer a oportunidade do professor continuar sendo um pesquisador mesmo tendo se distanciado das universidades”.
Professor: Felipe Sinicio de Barros
Centro Educacional São Bartolomeu, em São Sebastião
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Artigo da professora Maria da Glória Bonfin Yung